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29.12.10 às 7:11

Um pouco mais de Comércio Justo

Produtos de comércio justo devem obedecer alguns princípios relacionados à equidade entre homens e mulheres, ao preço justo, à transparência, por Glayson Ferrari
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Artigo publicado originalmente na edição de abril da Revista Idéia Social.

Para falar do comércio justo no Brasil é necessário compreender melhor as origens, os princípios e os valores desta forma inteligente e sustentável de fazer negócios.
Entre as décadas de 1960 e 70, nasceram na Europa diversas iniciativas que tinham como objetivo oportunizar mercados mais justos para comunidades localizadas em países pobres ou em desenvolvimento. Essas iniciativas foram crescendo e se profissionalizando, chegando a formar cadeias de lojas presentes em diversos países, com grupos de importadores, exportadores, distribuidores, organizações dedicadas a campanhas para conscientizar os consumidores e algumas outras dedicadas ao lobby no campo das políticas internacionais de comércio.

Um produto, para ser classificado como de comércio justo, deve observar e obedecer alguns princípios, valores e critérios relacionados à equidade entre homens e mulheres, à não exploração da mão-de-obra infantil, à preservação ambiental, ao preço justo, à transparência e às relações de solidariedade, entre outros.

Pouco a pouco, os países que antes eram apenas exportadores de produtos passaram a discutir as possibilidades dos mercados nacionais e dos mercados regionais.O Brasil é mais conhecido pela comercialização do suco de laranja, café e artesanato.Também podemos acrescentar a essa lista produtos como a castanha de caju, confecções, mel, frutas e muitos outros. Nos últimos dez anos o Brasil se desenvolveu muito em relação ao comércio justo, chegando a ocupar, atualmente, um lugar de destaque internacional, não só no campo da comercialização, como também no campo das discussões e construções políticas.

Esse amadurecimento levou à aglutinação de diversas organizações em torno do FACES, o fórum de articulação do comércio ético e solidário do Brasil. O FACE S, que nasceu informalmente há cerca de quatro anos atrás, agrega organizações de pequenos produtores, ONGs de assessoria a esses grupos, representantes de governos e até empresas comercializadoras. Organizações como a Unicafes, que reúne mais de mil cooperativas solidárias, o Sebrae Nacional, a FASE Nacional, o Imaflora, a Ética Comércio Solidário, o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), a SENAES (Secretaria Nacional de Economia Solidária), a Onda Solidária, o Instituto Kairós e a Visão Mundial fazem parte do FACES.

O conceito do comércio justo é relativamente desconhecido no Brasil, sobretudo pelos consumidores, atores-chave na ampliação das oportunidades de negócios para os pequenos produtores. Este é um dos maiores desafios do comércio justo, tendo em vista que o Brasil é um país de dimensões continentais e apresenta uma enorme variedade de tipos, formas e estratégias de comunicação comercial. Essa é a razão pela qual as organizações que trabalham com comércio justo devem investir nos próximos anos num processo intensivo de comunicação aos consumidores e de educação para um consumo responsável.

Para oportunizar mercados para pequenos produtores em um país como o Brasil é necessário o envolvimento do setor privado, pois a distribuição e a logística se tornam um desafio que não é vencido facilmente por pequenas estruturas.

Como o setor produtivo e comercial ligado à agricultura familiar, aos empreendimentos populares e solidários não conta com uma boa infra-estrutura e um nível de profissionalização que lhes permita competir num mercado de maneira igualitária, são necessárias políticas públicas que orientem os investimentos e as estratégias governamentais para o desenvolvimento deste importante setor econômico.

O Brasil avançou muito no campo das articulações políticas. É bastante conhecido por suas redes e fóruns, mas ainda há muitas lacunas no campo dos negócios. Há uma demanda incrível para profissionais do campo da comercialização, do marketing, da estratégia, da comunicação, da logística e de muitos outros nessa mesma linha. Muitas ações desenvolvidas por ONGs e pelo próprio governo são bem intencionadas, mas pouco efetivas segundo o ponto de vista do resultado econômico real e da sustentabilidade do negócio.

Como um grande mercado interno, o Brasil já atrai grandes organizações internacionais de comércio justo que enxergam no país potencial para desenvolver negócios.Se por um lado isso é bom, pois gera novos negócios, por outro lado o país perde a oportunidade de ter iniciativas nacionais, o que, nesse campo, seriam muito mais legítimas.

As certificações também se tornaram tema muito polêmico, quer seja pelos altos custos, quer seja pelo controle social. Há uma grande tendência de que o Brasil não adote os modelos internacionais assim como estão, mas encontre nos mesmos referências para o desenvolvimento de alternativas mais flexíveis, mais inclusivas, mais econômicas e com maior controle social.

Não podemos finalizar sem mencionar a essência do que estamos falando. Ainda que estejamos tratando de ferramentas econômicas que promovam o desenvolvimento para grupos menos favorecidos da sociedade, estamos falando mesmo é de uma vida feliz e sustentável, na qual todos os membros de uma sociedade ganhem, quer sejam produtores, quer sejam consumidores. Isto requer um projeto de sociedade, a consciência e a participação coletiva, além do compromisso na construção de um mundo onde nossas crianças, quem sabe, poderão correr livremente pelas praças, pois simplesmente não haverá mais ameaças do lado de fora. Impossível? Então prove o contrário!

* Glayson Ferrari é Diretor de Comércio Solidário da ONG Visão Mundial.

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