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29.12.10 às 6:09

A Floresta além dos verdes

Lideranças da sociedade civil revelam preocupação com a falta de informação ambiental a ponto de incluí-la em programa de educação, por Vilmar Berna
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Artigo publicado originalmente no Portal Envolverde.

É preciso, na verdade, é urgente, mudar nosso estilo de vida a fim de assegurar a preservação do meio ambiente e isso, além de não ser uma tarefa pequena, não é nada fácil, por que estamos falando de mudança, e mudar não é fácil, ainda mais quando o tipo de mudança necessária requer não apenas nosso esforço pessoal, mas também o esforço de toda uma coletividade planetária. Se quando depende apenas de nós já pode ser bem difícil! Quem tenta largar um vício ou emagrecer sabe do que estou falando. Imagine então um tipo de mudança que exige o esforço coletivo! Ainda assim, não temos alternativas. O que está em jogo não é sobrevivência de um ou outro indivíduo, ou mesmo de um coletivo nacional, mas da espécie humana inteira, sem exagero! O atual estilo de vida humano está pondo em risco o futuro tanto das presentes gerações quanto das que nem nasceram ainda, mas que já dependem de nossas decisões.

Nossa espécie está consumindo em torno de 20% a mais do que o Planeta consegue repor, segundo estudo realizado por 1.300 cientistas de 95 países. E como as relações entre as pessoas, as organizações e as nações não são iguais, uns conseguem explorar mais que outros. Segundo o Relatório Planeta Vivo – WWF, os povos da África e Ásia, por exemplo, usam em torno de 1,4 hectares por pessoa, os brasileiros usam em média 2,3 hectares, enquanto os povos da Europa Ocidental usam cerca de 5 hectares por pessoa. Nos EUA, cada norte-americano consome o equivalente a 9,6 hectares de recursos do Planeta. Com menos de 5% da população mundial, os Estados Unidos consomem 26% do petróleo, 25% do carvão mineral e 27% do gás natural mundial. Os automóveis, que rodam nos Estados Unidos, representam um quarto da frota mundial e emitem mais carbono do que todas as fontes – indústria, transporte, agricultura, energia – do Japão, o quarto país na lista mundial de emissões de poluentes. As conseqüências destas emissões, porém, recaem sobre os países pobres, mais vulneráveis às mudanças climáticas. Dos 700 desastres naturais registrados em 2002, 593 foram relacionados a eventos climáticos.

Os limites de nosso crescimento e a mudança na maneira de produzir e consumir os recursos do Planeta precisa ser negociado com a sociedade, por isso é tão importante e estratégico mantê-la bem informada. Se as informações forem falsas, incompletas, mentirosas ou baseadas em fantasias e mitos, nossas escolhas serão influenciadas por elas. A conscientização do brasileiro em relação ao Meio Ambiente aumentou 30% nos últimos 15 anos. (MMA/Iser 2005), o que nos dá motivos para ter esperanças, pois isso tem motivado mudanças concretas como a maior organização da sociedade na luta por seus direitos ambientais com as chamadas ONGs, organizações não-governamentais, dedicadas às lutas ambientais. Surgiu ainda uma legislação ambiental, que se torna mais rigorosa a cada dia. O próprio surgimento da mídia ambiental e o aumento do espaço para a pauta ambiental nos veículos da chamada Grande Mídia. A cada dia são criados novos cursos na área ambiental e realizados feiras, seminários, palestras sobre meio ambiente. Outro indicador importante é o número de novos livros dedicados ao tema ambiental. Os políticos e administradores públicos estão cada vez mais envolvidos com a causa ambiental e preocupados em dar retorno ao seu eleitorado. As empresas, mesmo as mais poluidoras, estão adotando sistemas de gestão ambiental, estão buscando a ecoeficiência, valorizando selos e prêmios ambientais, combatendo a poluição. Definitivamente, este é um caminho sem volta pois a tendência é de aumentar a cada dia a consciência ambiental na sociedade. Resta saber se o Planeta conseguirá sustentar a vida humana pelo tempo necessário até que todas as mudanças que estão em curso consigam produzir seus efeitos. Torço para que tenhamos tempo. Na verdade, trabalho por isso, pois tenho netos, e quero o melhor para eles e os filhos deles.

Tem sido estratégico neste processo de tomada de consciência da Sociedade a existência do jornalismo ambiental e de uma mídia ambiental alternativa, independente, capaz de olhar a floresta além das árvores. Ao informar o público e alertar as pessoas sobre os perigos ambientais que a cercam, a imprensa permite às pessoas recorrerem à ação para protegerem o meio ambiente. E diante do agravamento do superaquecimento do planeta e suas conseqüências o interesse do público pelo meio ambiente irá crescer a cada dia significando maior demanda por informação ambiental de qualidade.

Lideranças da sociedade civil organizada já revelam sua preocupação com a falta de informação ambiental a ponto de incluí-la, ao lado da educação ambiental, entre os três principais problemas ambientais brasileiros.

Em pesquisa de opinião com 1.141 dos 1.337 delegados participantes da “II Conferência Nacional de Meio Ambiente”, entre 10 a 13 de fevereiro de 2005, o  principal problema codificado foi o desmatamento (28%), seguido de recursos hídricos/Água (13%) e falta de informação sobre Meio Ambiente e Educação Ambiental (11%). A pesquisa foi realizada pelo ISER a pedido da Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável (SDS).

Quando falo de informação ambiental de qualidade falo de uma informação que mostre os fatos geradores da crise ambiental, para que as pessoas tomem consciência e possam atuar sobre as causas e não apenas sobre os efeitos. Um tipo de informação que mostre as raízes de nossos problemas ambientais e não apenas que reforcem uma visão romântica do quanto a natureza é linda ou é vítima de nossa ganância.

Quando falamos em mudança, é preciso investigar as raízes verdadeiras da crise ambiental, para não nos iludirmos com mudanças cosméticas ou investir nossas energias e esforços apenas na minimização dos efeitos da crise ambiental sem tocar nas causas. Por exemplo, é ilusão é achar que a ciência e a tecnologia limpa serão capazes de dar conta da crise ambiental, ou que a simples existência de informação ambiental e educação ambiental serão capazes de nos conduzir para fora da crise. Não vão por que por detrás da crise não está a ausência de ciência, de tecnologia, de informação ou educação ambiental, mas sim uma estrutura de apropriação de recursos e de acumulação de riquezas que irá perdurar independente se a tecnologia é suja ou limpa, se existe ou não democratização da informação ambiental ou educação ambiental. Entretanto, se a ciência e a tecnologia, a informação e a educação ambiental, por si só, não são capazes de solucionar os problemas provocados pela crise ambiental, sem elas é que a sociedade não terá a menor chance de sair dessa crise.

Por outro lado, também é uma ilusão achar que o mundo melhor que queremos, mais ecológico, justo, pacífico, democrático, começa no outro, depende dos governos, das empresas, do vizinho. Confúcio disse, há cerca de 5 mil anos, que se alguém quisesse mudar o mundo, teria de come¬çar por si próprio, pois mudando a si próprio, sua casa muda¬ria. Mudando sua casa, a rua mudaria. Mudando a rua, o bairro mudaria. Mudando o bairro, mudaria o município e assim por diante, até mudar o mundo. Na verdade, são lutas consecutivas. Ao mesmo tempo em que temos de nos preocupar em ser pessoas melhores, menos poluidoras, menos desperdiçadoras de recursos naturais, menos egoístas e materialistas, também precisamos ser melhores consumidores, capazes de dizer não aos produtos de empresas que não respeitam o meio ambiente e as pessoas, e também melhores cidadãos, evitando resumir nossa cidadania ao ato de votar a cada eleição, mas transformar o voto num instrumento de transformação da realidade, acompanhar o mandato dos que elegemos para cobrar deles posturas e ações que sejam do interesse do meio ambiente e da população. E esse exercício da cidadania não deve se resumir apenas ao aspecto eleitoral, mas incluir a atuação direta, por exemplo, através da sociedade civil organizada, pois quanto mais organizados estivermos, mais fortes e menos vulneráveis seremos.

(*) Vilmar Sidnei Demamam Berna vive em Jurujuba, Niterói (RJ), numa comunidade de pescadores artesanais. Por sua luta constante pela formação da cidadania ambiental planetária foi reconhecido pelas Organizações das Nações Unidas – ONU, em 1999, no Japão, com o Prêmio Global 500 Para o Meio Ambiente.

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