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18.05.11 às 11:01

A crise ambiental e o impacto sobre o capitalismo

O descontentamento crescente com o livre mercado pavimenta também o caminho para apostar num novo modelo, ancorado na economia verde
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“As mudanças climáticas representam um dos maiores fracassos do sistema de mercado que já se viu.” As categóricas palavras de Nicholas Stern – na época economista-chefe do Banco Mundial – para contextualizar os desafios que a economia e a sociedade enfrentam na maneira de conduzir seus negócios em tempos de aquecimento global têm várias qualidades. Elas sintetizam o consenso retrospectivo sobre um modelo de desenvolvimento ancorado em premissas erradas: mais consumo, mais poluição, mais desigualdade social e infelicidade pessoal, crescimento em vez de bem-estar. Mas, também, dão uma dica sobre a necessidade de reinventar a noção de livre mercado como base geradora de riqueza e oportunidades ou arriscar novos fracassos ou o aprofundamento do grande fracasso atual.

Mencionadas antes da crise econômica iniciada em 2008, essas palavras poderiam trocar o sujeito “mudanças climáticas” por “sociedade de consumo supérfluo e conspícuo”, “expansão baseada no endividamento”, “epidemias de obesidade e depressão” ou “escândalos éticos ou socioambientais de grandes corporações” e caber, perfeitamente, como uma luva. A forte dependência na intervenção estatal para minimizar ou controlar as crises financeira e ambiental que testemunhamos nestes últimos anos claramente reforçam a ideia central da mensagem de Stern: o livre mercado – entendido como uma proposta de progresso econômico e social, desregulada e autoequilibrante – não funciona. O livre mercado não apenas deixa a desejar na obtenção de bons resultados – ou na distribuição mais eficiente de benefícios do ponto de vista coletivo – como também adoece de uma opacidade intrínseca na maneira de calcular os custos de produção e consumo. Isso porque esquece o capital natural como fator de produção ou ignora os custos diretos (degradação ambiental, escassez de recursos naturais e outros) e indiretos (impacto da poluição na saúde, aumento da insegurança alimentar e climática, por exemplo) das atividades econômicas. Quanta diferença de vinte anos atrás, quando o livre mercado era elogiado como a panaceia social e econômica e sua conquista das mentes e corações de consumidores e autoridades do Oriente ao Ocidente, do hemisfério Norte ao Sul, celebrado como o “fim da história”!

E os consumidores? Qual é a visão que eles construíram do livre mercado ao longo destes anos? Até que ponto a declaração lapidária do ex-Banco Mundial sobre a versão econômica neoclássica ecoa na cabeça dos cidadãos do mundo? Estão os acontecimentos climáticos e ambientais levando a uma revisão da confiança na economia de livre mercado?

Dados do estudo global Barômetro Ambiental 2010, realizado pela Market Analysis, apontam claramente um desgaste do modelo imperante aos olhos da opinião pública. Em menos de uma década, o apoio ao sistema de livre mercado caiu quase dez pontos percentuais, e essa queda tem sido contínua e sistemática. Hoje, pouco mais da metade dos consumidores (55%) nos países pesquisados entende esse modelo econômico como ideal.

Paralelamente, ao longo destes anos, aumentou a gravidade atribuída às mudanças climáticas, junto ao maior número de eventos climáticos e naturais extremos no mundo – que passou de 640, em 2004, para 850, em 2009. Quase dez anos atrás, em 2002, apenas um em cada quatro (24%) cidadãos enxergava o aquecimento global como fenômeno muito sério; no final da década, esse percentual mais do que duplicou e se converteu em maioria, na maior parte da percepção pública: 53% (alcançando até 83% quando se somam as opiniões de quem considera as mudanças climáticas como razoavelmente sérias).

A correlação entre ambas as posições da opinião pública é extremamente elevada e negativa, atingindo um coeficiente de -0,74 (quando o máximo possível seria -1,0). Traduzindo os dados em termos cotidianos: na medida em que as catástrofes aumentaram, acentuando uma preocupação aguda com as mudanças climáticas, a identificação com o sistema econômico atual foi despencando. Quer dizer que os consumidores chegam a conectar uma coisa com a outra? É o que os dados sugerem.

A afirmação de Stern – sobre o aquecimento global como expressão do maior fracasso da versão business as usual da economia – reverbera numa parcela expressiva da população mundial. As opiniões dos cidadãos, tanto em países emergentes como em desenvolvidos, não apenas indicam frustração diante de um modelo que nos últimos anos tem mostrado inaptidão para resguardar as fortunas individuais e coletivas, as riquezas do presente e do futuro; o descontentamento crescente com o livre mercado pavimenta também o caminho para apostar num novo modelo, ancorado na economia verde e no desenvolvimento sustentável.

Fabián Echegaray é Ph.D em Ciência Política pela Universidade de Connecticut (EUA) e diretor-geral da Market Analysis, instituto de pesquisas especializado em sustentabilidade e responsabilidade social.

Artigo extraído do site Ideia Sustentável

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