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31.07.14 às 18:06

Efeito dominó do derretimento do Ártico – tarde demais para nós?

Os líderes do mundo deveriam na verdade estar focados nos riscos inerentes vindos do derretimento completo do Ártico, que hoje é o canário na mina de carvão* para o todo o planeta
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Crédito da foto: Pelo Pantón/ Creative Commons

 

Os principais assuntos globais hoje incluem a recuperação das economias da crise financeira de 2008 e das guerras regionais por controle territorial, como no Iraque. De qualquer maneira, primeiramente e mais importante, os líderes do mundo deveriam na verdade estar focados nos riscos inerentes vindos do derretimento completo do Ártico, que hoje é o canário na mina de carvão* para o todo o planeta.

As lutas territoriais no Oriente Médio e na Ucrânia, quando comparadas com a situação do Ártico, é equivalente à imagem de crianças brincando com bonecos de borracha. De fato, mais um passo à frente, e a consequência final de um Ártico sem gelo fará Hiroshima parecer como um piquenique em uma tarde de verão.
Já é bastante óbvio que nenhuma grande nação está se antecipando para a crise no Ártico, caso contrário, elas estariam correndo o mais rapidamente e humanamente possível para trocar seus combustíveis fósseis para fontes de energias renováveis.

Cuidado: gelo fino à frente

Da maneira como as coisas estão, as condições do gelo marítimo no Ártico estão perigosamente próximas do abismo. Essa é a situação: a extensão do gelo no início do mês de julho está próxima de bater um recorde de baixa para essa época do ano. Mas a principal preocupação é a velocidade com que esse declínio está acontecendo. Continuando nessa corrente, o derretimento tenderá a ficar cada vez mais veloz.

Como publicado em 4 de julho no Arctic News: “O atual declínio da extensão do gelo marítimo está muito maior do que o comum para essa época do ano, além disso, o total colapso do gelo ártico pode ocorrer se tempestades continuarem  a acontecer – forçando mais gelo ártico a cair no Oceano Atlântico.

Compreendendo a crise de um Ártico sem gelo

As ramificações terríveis e destrutivas de um colapso total do Ártico não são completamente compreendidas por 99,99% das pessoas no planeta. Este apenas um chute, mas provavelmente é um chute muito bom. Afinal, que quer perder seu tempo compreendendo o derretimento do gelo seriamente?

Todavia, os detalhes sobre as prováveis consequências de um Ártico sem gelo já estão disponíveis. Como no brilhante vídeo tutorial, tudo o que uma pessoa precisa saber sobre o derretimento do Ártico em 40 minutos.

Para aqueles que têm déficit de atenção e não conseguem assistir, o resumo seria esse: o planeta pode virar um inferno, e isso em décadas e não séculos.

Baseando-se em observações diretas e não de modelos científicos, o volume do gelo marítimo já está em colapso, por exemplo: o volume durante a década de 1990 era cerca de 15 mil km³, em 2006 era de 10 mil e em 2012, apenas 3 mil

Além disso, a mudança no padrão da perda da massa de gelo está acelerando: a perda era estável ao longo da década de 1980, nos anos 1990 foi para 4,5 mil km³, durante os anos 2000 foi para 9 mil e em 2013 era de 13 mil.

Então é possível que a “atividade humana lançando muito CO2 na atmosfera”, já nem seja mais aplicável para a perda de massa de gelo, pois aparentemente a situação já está próxima de se “autoamplificar”.

Como em uma fileira de dominós, uma vez que o Ártico esteja livre de gelo no verão de setembro, toda a energia solar que anteriormente derreteu esse gelo está agora disponível para aquecer os mares e o pergelissolo. Assim sendo, quando o inverno voltar a congelar as águas, o gelo estará mais fino e, no ano seguinte, o derretimento será mais rápido e assim, se autoperpetuando e derrubando os dominós, nós teremos:

– a liberação de metano (CH4) congelado por milênios nos blocos de gelo e que é o gás mais efetivo para a aceleração do aquecimento global
– a aceleração de um eventual colapso do gelo da Groenlândia, causando um aumento em potencial de 21 pés no nível da água do mar,
– a distorção as correntes do Golfo
– a distorção das correntes de ar acima de 30 mil pés de altitude, criando temperaturas anômalas por todo o hemisfério norte.

Essas consequências são horrendas, impensáveis e aterrorizantes e, como tudo parece sugerir, o derretimento do gelo é, de fato, exponencial, o que torna os “modelos” usados pelo Painel Intergovernamental da Mudança Climática (IPCC), que luta para evitar um Ártico sem gelo no futuro, irrelevantes e inúteis.

Usando biquínis no Polo Norte

Um dos grandes problemas do planeta é muito calor em todos os lugares errados.

Na Groelândia, “segundo o instituto nacional climático, a maior temperatura já registrada para o mês de junho foi atingida no dia 15, de 23,2 °C.

Em 2 de julho, a gélida região de Labrador, no Canadá, chegou a 30°C. O aquecimento do Ártico está alterando as correntes de ar e mudando drasticamente os padrões climáticos do Norte.

“Ao passo que o Ártico está esquentando mais rápido que o Equador, a diferença nas quedas de temperaturas entre os dois reduz a velocidade na qual o ar quente se move do Equador para o Pólo Norte. Isso, por consequência, diminui a velocidade na qual as correntes de ar circunavegam o globo no hemisfério norte, deformando assim as correntes de ar”, lia-se na matéria “O que está de errado com o clima”, do Artic News.

Política: a cúmplice da negação do aquecimento global

A evidência tangível da mudança climática radical, especialmente no Ártico, torna muito difícil de aceitar, sem dar risada, a repetida afirmação de que os EUA são os “líderes do mundo livre”.

Afinal, nas últimas duas décadas, os EUA tem sido um destemido obstáculo para o mundo livre conseguir solucionar a controversa mudança climática/aquecimento global. Quando foi a última vez que o Congresso norte-americano fez qualquer coisa construtiva sobre a crise climática?

Ah…

O cenário politico norte-americano está recheado de declarações ingênuas e mentirosas sobre a mudança climática que vão além da falha, banal e simplistas referências ao aquecimento global como uma farsa; ou questionar a ética dos cientistas ou dizer que isso é uma conspiração de Hollywood com Al Gore.

Essas são respostas de criança para um assunto de adultos, e algumas das declarações mais infantis vêm, invariavelmente, de candidatos presidenciais.

E se o Ártico ficar sem gelo até 2020, ou mesmo antes?

De acordo com o maior especialista mundial sobre gelo polar, Peter Wadhams, professor de Físicas do Oceano Polar na Universidade de Cambridge, que conduziu pessoalmente 40 expedições polares, incluindo dez missões em submarinos nucleares debaixo do gelo para medir precisamente a espessura do gelo: uma vez que o gelo vai ficando cada vez mais fino, ele irá desaparecer…para sempre.

As consequências resultantes são terríveis ao passo que o aquecimento se autoamplifica e o planeta passa do ponto de ebulição – sendo essa apenas uma das várias consequências já mencionadas.

Por mais difícil que seja acreditar que tudo isso possa de fato acontecer e, francamente, é muito difícil de visualizar a realidade disso além de uma possibilidade, é a ainda mais exasperante saber que a liderança dos EUA permanece ociosa, enquanto o gelo vai embora cada vez mais rápido.

Afinal de contas, há opções construtivas e técnicas, algumas experimentais – outras como conversões para fontes de energia renovável, que podem mitigar a situação, até mesmo prevenir o colapso, mas quem é que sabe?

De agora em diante, no final do dia, ninguém sabe ao certo quando, ou se já é, tarde demais.

Mas, baseando na atual taxa de perda de gelo, que esteve ali desde o tempo em que mundo era mundo, algo desastroso está destinado a acontecer.

 

Robert Hunziker é mestre em história econômica pela DePaul University

Artigo publicado originalmente no site Conterpunch

(*A expressão “canário da mina de carvão” deriva da prática antiga de levar canários para minas de carvão, de tal forma a que se estivesse presente um gás venenosoo canário morreria antes de este afetar os mineiros, como um aviso de perigo eminente)

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