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20.07.15 às 11:12

John Parsons foi um ícone da luta ambiental na histórica cidade de Tiradentes

Ecologista inglês escolheu a cidade mineira para viver e dedicou-se a cuidá-la

 Foto: O ecologista John Parsons, em frente ao chafariz de São José em Tiradentes (MG) – Crédito: Arquivo pessoal  

 

 

John Parsons, ecologista e engenheiro inglês que se tornou um ícone na preservação ambiental e conservação de Tiradentes, em Minas Gerais, faleceu no final do mês de junho, na cidade que escolheu para viver e cuidar.

Casado com uma brasileira, Anna Maria, Parsons foi um dos pioneiros a contribuir para restaurar o patrimônio histórico ameaçado de Tiradentes, além de construir um marco da cidade, o Solar da Ponte, a primeira pousada com hospedagem de qualidade, inaugurada em 1972.

Desde que estabelecidos no Solar da Ponte, o cuidado com as ruas e com a cidade foi visto, por John e Anna, como uma extensão do cuidado e do fazer impecável que sempre caracterizou o ambiente do Solar da Ponte. A rede de amigos criada e desenvolvida pelo casal foi empregada em benefício da cidade e dos seus habitantes, inicialmente como um grupo informal de pessoas e, desde meados da década de 70, por meio da SAT – Sociedade de Amigos de Tiradentes, fundada por Parsons.

A partir daí, John contribuiu, de forma decisiva, para desenhar a planta turística de Tiradentes; para o retorno das denominações tradicionais das ruas da cidade; para a elaboração de um projeto visando enterrar os fios de eletricidade – o que conseguiu após anos de negociações com a Cemig; para a pintura de todas as fachadas, a retirada de toldos e marquises indevidos na preciosa arquitetura do século XVIII; para o conserto, sem ônus para a cidade, das goteiras de telhados das casas antigas; para a recuperação do sobrado dos Aimorés.

Com Aloísio Magalhães no Pró-Memória, John foi defensor da aquisição da atual sede do IPHAN na cidade, o Sobrado Ramalho; e, conseguindo o apoio da Cemig, da Telemig e da Fundação Roberto Marinho, contribuiu também para viabilizar a construção do CCYA – Centro Cultural Yves Alves na Rua Direita.

Desta forma, foi possível para a cidade atrair não apenas turistas sempre encantados com o que viram, mas também hóspedes do meio artístico que trouxeram produções cinematográficas para a cidade e a tornaram mais conhecida. As excelentes relações com a Rede Globo despertaram o interesse de locação da cidade como cenário de suas novelas e de várias inserções na sua programação. As folias de reis foram incrementadas; e a programação cultural da cidade foi e continua sendo ampliada.

Amigos de John e Anna, assim como os turistas que visitavam e se encantavam com a cidade, se tornaram proprietários locais. Enquanto tudo isso ocorria, alguns de seus funcionários mais empreendedores viravam hoteleiros (e pousadeiros), copeiros e garçons viravam “restaurateurs”, e, até mesmo, historiadores, construtores, comerciantes e lideranças locais.

É impossível enumerar tudo o que John Parsons fez por Tiradentes. E, nisso tudo, sua figura aparecia sempre com a enorme bondade, elegância, desprendimento e amor que John punha em tudo o que fazia.

Parsons teve também um papel central no tombamento da Serra de São José e na despoluição do córrego Santo Antônio.  “Ele foi um verdadeiro missionário trabalhando a favor de todo o tipo de vida no planeta, sempre fascinado com a natureza e inconformado com a falta de compreensão das pessoas em relação às leis que a definem. O mundo seria muito melhor e mais sustentável se tivéssemos mais pessoas com as qualidades e a persistência de John Parsons”, disse Helio Mattar, diretor-presidente do Instituto Akatu e amigo de Parsons. Nesse sentido, John foi incansável na luta contra os incêndios na Serra, contra os quais ele atuava pessoalmente, conforme relata Anna Maria, “chegando em casa todo sujo de fuligem e sempre indignado com a falta de cuidado dos turistas que causavam os incêndios”. Na mesma direção, ajudou a constituir um corpo voluntário de bombeiros, que foi acionado inúmeras vezes para fazer frente à ameaça de destruição da Serra pelo fogo.

John Parsons era fascinado com a riqueza de vida contida na linda montanha em frente a Tiradentes, sempre ressaltando o fato de alguns tipos de bromélias e de borboletas só existirem naquela microrregião. E levava tão a sério seu respeito à natureza que nem mesmo admitia regar o jardim de sua casa durante o período de seca, ato que criticava, sempre de maneira doce, gentil e bem arrazoada, mas deixando claro seu desagrado em relação àqueles que o faziam.
Parsons dedicou uma boa parte de seu tempo a conhecer e divulgar a Teoria de Gaia, desde que originalmente proposta pelo investigador britânico, James Lovelock, em 1972. A teoria, depois chamada de Hipótese de Gaia, hoje largamente aceita, defende que o planeta é um organismo vivo, auto regulado, que se mantém em equilíbrio até que uma contradição interna ou uma força exterior a ameace e exija uma reação. John mantinha na pequena biblioteca do Solar da Ponte alguns livros relacionados a suas crenças na ecologia profunda, sempre na expectativa de que mais algumas pessoas se juntassem ao grupo de defensores do nosso planeta. “Fazemos parte de um ecossistema que dita certas regras para nosso comportamento. É hora de incluir estas regras nas promessas eleitorais e nos currículos escolares”, defendeu Parsons no artigo “O planeta azul: promessas para o futuro”, publicado com exclusividade no portal Akatu poucos dias antes de seu falecimento. Duas semanas antes de falecer, John trabalhava esse artigo fazendo pequenas adições e correções, com o ânimo e entusiasmo daqueles que plantam a eternidade a cada dia e a cada segundo de vida.

Uma semana antes de falecer, Helio Mattar fez uma visita a Parsons no hospital de São João del Rei. John havia pedido essa visita na qual quis que estivessem juntos, Helio e José Luiz Alquéres, amigo do John de longa data. Lá chegando, depois de uma breve troca de cumprimentos, John descreveu a razão para ter pedido essa visita. Falando pausadamente, quase uma palavra por vez, John mostra um caderno onde havia escrito uma ideia que o entusiasmava. Disse então: “Vocês devem conhecer alguém próximo ao Prince Charles. Precisam falar com ele. Ele tem que se envolver na defesa de Gaia. Se ele falar, todos vão ouvir”. Em várias ocasiões, John havia demonstrado sua preocupação com a dificuldade em disseminar amplamente o conceito de Gaia, daí a ideia desse pedido ser feito ao Prince Charles. José Luiz e Helio contaram então ao John sobre a encíclica do Papa Francisco, da qual ele não havia tomado conhecimento, e onde esse tema foi tratado, entre outros, de  forma balizada, científica e apaixonada. Bravô!, disse John, em seu jeito britânico e carinhoso de celebrar. E, ainda assim, insistiu, “falem com o Prince Charles, ele também pode ajudar!”

Bravô!, John Parsons. Bravô!

Leia mais:

O planeta azul: promessas para o futuro

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